quarta-feira, 30 de setembro de 2009

CARTOGRAFIAS PRAIEIRAS!!!




Cheguei a Areia Preta e sentei-me na areia para começar minhas observações e anotações. A manhã estava linda, com um sol radiante e a maré estava enchendo. Havia alguns surfistas pegando onda, e uma turma de homens jogando bola, além de mulheres em crianças brincando na areia e tomando banho. Fiquei observando primeiramente os homens que jogavam, lembrei do texto sobre a praia, e me perguntei se aqueles homens estavam preocupados com suas barrigas ou bundas. Eles estavam livremente jogando com um palavrório nada padrão, mas muito soltos e acho que naquele momento o que importava era o prazer do jogo e não as suas “circunferências” abdominais. Vale ressaltar que o público daquele pedaço de areia, ou seja, daquela cartografia praieira não está inserida na elite da sociedade, nem naqueles modelos padrões de corpos sarados e espelhos de perfeição, apesar de estarem na frente de apartamentos caríssimos, onde vive uma elite da sociedade potiguar que está inserida na cultura lipofóbica. Mas claro que esta elite não coloca nem o dedinho do pé na areia de Areia Preta, nem pensar – é lugar de pobre, gordo, farofeiro e outras categorias excluídas, a esta elite é reservada a bela vista do mar de suas altas varandas. Depois olhei as mulheres que tomavam sol, algumas sozinhas e outras cuidando de crianças, criança sempre é lindo de se ver, sempre espontâneas e livres, qualidades que os adultos vão perdendo cada vez mais na sociedade de controle que vivemos, cada vez que submetem-se ao sistema de escravidão capitalista, social, estético,etc..., mas voltando às mulheres, observei seus corpos, a maioria fora dos padrões sarados que está no texto de Joana Novaes. Estão mais para o padrão dos moradores das favelas do Rio que usam bronzeador de beterraba e tentam se adequar aos padrões, apesar de estarem sempre fora deles e excluídas, seja pela pobreza, seja pela gordura, seja por que motivo for. Fiquei ali por algum tempo e depois resolvi ir para a praia dos Artistas. No calçadão já vi muitas pessoas caminhando, jovens, velhos, turistas. Resolvi descer para a praia, pois queria observar mais como as pessoas faziam uso da praia e de seus corpos. Vários surfistas pegando onda, um esporte que eu particularmente acho muito interessante, me fizeram até lembrar de Deleuze, um filósofo instigante e intenso, que também no final de sua vida prestou atenção aos surfistas e falou de uma forma incrível de como pegar onda é uma metáfora da vida, “se equilibrar entre os altos e baixos”, “aprender a fluir com o movimento”, é um filósofo interessante, que me fez refletir algumas coisas naquele momento, mas que são muito minhas, não desse diário de campo. É interessante como o surfista é marginalizado e sofre preconceito por aparentemente não fazer nada e viver só pegando onda, mas, por outro lado, geralmente, eles são sarados, bronzeados, portanto, dentro da categoria da cultura lipofóbica, um paradoxo interessante de se pensar, pois o preconceito sempre impede de olhar as coisas com mais profundidade e entender realidades que muitas vezes fogem do controle rígidos dos olhos que “vigiam e punem” da sociedade. Voltando a observar as mulheres deste outro pedaço de areia, mas na mesma cartografia, vi mulheres de todas as cores... desde as “transparentes” até as negras, passando pelas morenas de sol. Vi mulheres se besuntando com água oxigenada nas pernas, nos braços, barriga, nas costas, uma cena que creio só aconteça nessas partes onde o público que freqüenta são os farofeiros, os pobres, enfim, nada de elite, pois nunca vi isso em praias ditas elitizadas, e esse comentário não tem intenção preconceituosa, faz parte deste trabalho da observação de campo sobre o uso dos corpos e suas formas de estarem no mundo. Mas é ótima a espontaneidade destas mulheres, nem ai para quem está julgando, elas querem é ficar com os pêlos louros. A maioria das mulheres se preocupa com sua aparência, geralmente as mulheres são vaidosas, e isso independe de classe social, claro que é muito mais fácil para quem tem poder aquisitivo, como já ouvi no interior “não existe mulher feia, existe mulher pobre, não existe mulher bonita, existe banho de loja”, adoro estes ditados populares!!! Então essas mulheres que não estão na elite se viram como podem, desde dar massagem nos cabelos em casa com receita caseira (que pode ser abacate com mel, ovo com azeite, iorgute com mel, leite para clarear e toda sorte de milacria) com touca térmica, até fazer a sobrancelha com a comadre, depilar com gilete, passar água oxigenada na praia para ficar loirinha... e por ai vai, desde que estejam bonitas, dentro de suas limitações, é o que importa, pois vivemos numa sociedade onde ser feio é motivo de exclusão e chacota, vivemos numa sociedade cruel. Fiquei observando várias mulheres, é interessante observar como o corpo se expressa, é interessante como fica claro quando a pessoa está bem com seu corpo e quando não. As mulheres principalmente, na maioria dos casos estão preocupadas com seus peitos e bundas (ao contrário dos homens que vi jogando bola em Areia Preta), se preocupam com seus corpos e medidas, vivem escravas do poder da mídia que impõe uma beleza idealizada e irreal, principalmente para quem não está na elite, pois para a classe A é fácil ser Bárbie, ou seja, os ricos podem fazer plásticas e tudo o que é preciso para estarem dentro dos padrões lipofóbicos. Já os pobres mortais assalariados, além de não terem poder aquisitivo, sofrem ainda mais por não terem acesso, por serem excluídos, uma realidade cruel. (para quem se submete é claro, o pior é que a maioria se submete, EH vida de gado...!!!!!)


Depois de ficar um tempo observando várias pessoas, crianças correndo, brincando na areia, chupando picolé, comendo pipoca, coxinha, refrigerante, se divertindo, passei a observar as pessoas que estavam ali para conseguirem seu sustento, vendendo picolés, comidas, óculos, bronzeadores, várias coisas e fiquei pensando na dificuldade que aquelas pessoas enfrentam no dia-a-dia para conseguirem sustentar suas famílias, em como seria a vida dessas pessoas, no cansaço ao final do dia e no lucro minguado de suas vendas. Fiquei triste por vivermos escravos de um sistema perverso que uns vivem a opulência absurda e outros a carência absurda, que mundo é este???????????????????


Voltei para casa com mil questionamentos na cabeça e várias cenas interessantes na memória.

Janaina Ismenia de Melo.
(imagem da praia do Forte e praia dos Artistas)

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